A Bíblia Dake, repercussões e um convite à reflexão [2]

R e p e r c u t i u   na blogosfera na última semana a entrevista concedida ao blogueiro Judson Canto pelo pastor Antonio Gilberto, consultor teológico da CPAD e integrante de seu conselho editorial. Tendo tomado conhecimento das informações apresentadas por ele ao caro colega Judson analisei suas respostas e colocações, e refletindo sobre o assunto em questão resolvi falar sobre suas repercussões e convidá-lo, amigo leitor, a refletir comigo alguns pontos importantes presentes nas informações apresentadas pelo nobre pastor Antonio Gilberto.

Para tanto, sinto-me tranqüilo em expor minha opinião neste meu espaço por pelo menos três razões básicas: Primeira: Sou assembleiano, e acima de tudo desejo uma igreja que atue através de seus órgãos valorizando a ortodoxia doutrinária e teológica; Segundo: tenho assegurado [assim como você, amigo leitor] o direito e a liberdade de expressar minha opinião, mesmo sabendo que a polêmica em torno do assunto divide opiniões; e Terceira: Este é o meu terceiro post sobre o tema. Como não propus em nenhum momento o fim das conversações sobre o assunto de forma impositiva como fizeram alguns blogueiros, sinto-me a vontade para debater idéias respeitando as opiniões contrárias.

Para começar, gostaria de esclarecer que minha reflexão se dará através de citações presentes no post de Judson Canto, seguidas por uma reflexão onde apresentarei a minha opinião:

1 – “...Então dei o meu parecer. Eu disse: ‘Olha, a Bíblia é um manancial. É uma riqueza para estudantes, para pregadores, para pastores, para escritores. Mas faço algumas ressalvas, porque nela há alguns pensamentos intelectualistas, quer dizer, produto do cérebro humano. Há também alguns pensamentos racionalistas, da razão humana. Há também uma porção de pensamentos que são filosóficos. Mas o irmão Dake é falecido, a gente não pode conversar com ele e perguntar por que ele fez aquilo. Então sugiro que a CPAD obtenha licença para isentar a edição brasileira nesses pontos’. E, de fato, alguma coisa foi feita, mas, por razões que desconheço, passaram outras.”

Podemos inferir da declaração do nobre pastor as seguintes conclusões: A obra de fato impressiona pelos números e pela estrutura, porém possui conteúdo incompatível com a teologia adotada pelas ADs. Esse é um dos pontos mais importantes de sua entrevista. Nesse contexto, há quem apresente apenas um lado da moeda no debate, e preocupados em apresentar uma defesa cega da obra recomendam-na como se não houvesse problemas complexos. Acredito que o momento exige uma mobilização para esclarecimento dos pontos polêmicos, e não uma luta desesperada pela sua aprovação.

2 – “...Então sugiro que a CPAD obtenha licença para isentar a edição brasileira nesses pontos’. E, de fato, alguma coisa foi feita, mas, por razões que desconheço, passaram outras.”

Parafraseando o que o mestre disse, poderíamos apresentar seu pensamento na seguinte sentença: “Apresentei os problemas presentes na obra solicitando uma edição que isentasse a edição brasileira destes erros, alguns foram retirados, outros passaram. O porque? Desconheço”. De acordo com as informações apresentadas pelo Conselho de Doutrina e da Comissão de Apologética da CGADB, não houve como suprimir idéias incompatíveis do autor na obra pois “trata-se de um pensamento que norteia todo o texto e não se tratando de casos isolados”. Assim, a supressão de idéias apresentadas por Dake na obra simplesmente tornariam o projeto editorial inviável, daí a recomendação do conselho e da comissão de se suspender a venda e distribuição da obra. A pergunta que fica é a seguinte: Os riscos de se publicar a obra nessas condições era conhecido, porque então se deu prioridade a sua publicação? Sabendo dos problemas presentes na obra, porque a mesma foi apresentada nas peças publicitárias da editora como “revisada com todo rigor teológico e doutrinário?

3 - “O Conselho da Casa se reuniu e bloqueou o assunto. Só posso me pronunciar em reuniões...” e “..[Judson] Perguntei se ele havia apontado especificamente alguma heresia, e Ele [Antonio Gilberto] respondeu que estava impedido de dizer, em razão de seu acordo com a Casa.”

Exímio conhecedor do conteúdo de Dake, pastor Antonio Gilberto foi impedido de falar sobre as heresias presentes na obra pelo conselho da CPAD – essa atitude por si só corrobora a realidade de que a repercussão negativa em torno da obra é uma reação natural do público leitor que, conhecedor da ortodoxia teológica assembleiana não pode concordar em ver uma obra com conteúdo duvidoso publicada pela editora oficial da denominação. Daí a utilização do recurso do eufemismo como figura de linguagem para descrever seu conteúdo: “pensamentos intelectualistas”, “pensamentos racionalistas” e “pensamentos filosóficos” – ora, não são esses os pensamentos responsáveis pelo surgimento de heresias?

4 - “Pergunto: por que é que esses irmãos que estão sendo contrários não citam o caso do Novo Testamento interpretado, que contém impropriedades? ...mas ninguém está falando contra Champlin. Logo se vê que é simplesmente ataque.”

Discordo do nobre pastor. A publicação da obra de Champlin pela CPAD foi e ainda é motivo de debates em círculos teológicos e mesmo na blogosfera evangélica. A diferença está no fato de que na ocasião da publicação da obra a blogosfera não dispunha da notoriedade de que dispõe hoje, contribuindo assim para que o debate em torno do assunto estivesse centralizado nos círculos teológicos em escolas e cursos, e entre leitores anônimos ou simplesmente por pessoas que não tornavam público suas divergências por medo de retaliação ou qualquer outro sentimento semelhante. Não podemos descartar também a existência de grupos que aceitam beber água de qualquer fonte, e por isso desconhecem sua procedência. Se a obra estivesse sendo publicada agora seria alvo de intensa manifestação, tanto favorável quanto contrária, assim como neste episódio envolvendo a Bíblia de Dake. Deve ser levado também em consideração que há uma enorme parcela de consumidores que não tiveram acesso a obra de Champlin, mas que já tiveram acesso a bíblia de estudo, pois a mesma possui uma capacidade maior de penetração entre os membros das igrejas. Assim, reconheço que há pessoas que estão se aproveitando da ocasião apenas para desferir ataques, e seus argumentos se esfarelam quando postos à prova, mas há quem apresente argumentos dignos de serem levados em consideração e portanto não devem ser silenciados com a alegação de que estão trabalhando contra a editora, a convenção ou denominação, e muito menos tachados de “analfabetos teológicos” ou como “blogueiros ignorantes e amargos” como alguns obreiros, líderes e membros ligados a editora disseminaram.

5 - “[A Dake] é uma riqueza, e eu a recomendo, com aquelas ressalvas”.

O debate em torno da obra tem sua parcela de contribuição no desenvolvimento teológico das ADs – sinal de que o público leitor está melhor preparado para discernir entre o que é ortodoxo e o que não é, e a partir daí preparados para defender a fé com maturidade. As ressalvas apresentadas pelo nobre mestre são exatamente as mesmas que os blogueiros e outros pastores, líderes, obreiros e membros sérios, responsáveis e comprometidos com a ortodoxia estão apresentando, debatendo e repudiando em seus espaços na internet em blogs, sites e redes sociais, e aos seus públicos em cultos de ensino e outras reuniões pelo país afora.

Reflexão

Como o próprio Conselho de Doutrina e Comissão de Apologética da CGADB reconheceu ao recomendar a suspensão da venda e distribuição, a publicação da Bíblia Anotada de Dake pela CPAD foi o pior fiasco que a instituição pode sofrer nos últimos anos, e já começa a causar impacto em convenções e igrejas.

No entanto, no meu ponto de vista, o episódio se manifestou trazendo a tona algumas realidades que podem ser verificadas nas mais diversas expressões tanto daqueles que são favoráveis como contrários ao seu conteúdo ou ao fato da mesma ter sido publicada por uma editora confessional – e nesse quesito minha reflexão sobre entrevista do mestre Antonio Gilberto aponta exatamente para essas expressões. São as seguintes:

1) A obra não está isenta de erros, daí a falácia de sua defesa integral e a necessidade de se explicitar, apontar e repudiar as idéias incompatíveis presentes na obra; 2) diante do exposto, a CPAD impõe uma mordaça com medo de que a estrutura seja desfeita, daí o manifestação de despreocupação com os resultados negativos que podem ser gerados, uma atitude irresponsável pois a CPAD deve acima de tudo servir as igrejas [para isso foi criada, e não o contrário] e não contribuir com a confusão; 3) o debate em torno das heresias presentes na obra são um sinal de que os cristãos evangélicos pentecostais brasileiros estão melhor preparados para refutar as heresias que se manifestam tanto em tribunas de púlpitos quanto em obras editoriais, condição esta que deve ser reconhecida por aqueles que insistem em defender a obra menosprezando a instrução dos que a repudiam; 4) levando em conta que os primeiros questionamentos da obra se deram pelo fato da mesma ser alvo de denúncia em um produto editorial da própria CPAD [o livro Cristianismo em Crise de Hank Hanegraaff] não faz sentido a publicação de obras que questionem idéias e doutrinas incompatíveis com a teologia adotada pelas ADs sob alegação de “pluralidade de idéias” ou exposição de “leques de assuntos” e de que “cada um faça a sua escolha com sabedoria”. 5) o mesmo vale para blogueiros e web-designers que, auto-intitulados como defensores da palavra de Deus, ao defenderem a obra se esquecem de que seus blogs e sites ocupam o topo das visitas na internet simplesmente pelo fato de questionarem com veemência e ironia outros desvios até de menor importância do que os presentes na obra de Dake – uma estridente contradição que representa o real compromisso de seus editores: o corporativismo barato que leva acima de tudo em consideração apenas a afinidade e a conveniência.

Concluindo, parabenizo o colega Judson Canto pelo post, e manifesto aqui meu respeito e consideração pelo consultor da CPAD, pela CPAD e por todos os envolvidos no processo de publicação da obra de Dake. O episódio foi sem dúvida alguma um deslize, e acredito que a editora aprenderá com os erros cometidos.

S i d n e i M o u r a

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