Censura

Luiz Cláudio Jubilato

Outro dia escrevi sobre a extinção das borboletas nas grandes cidades: um prefeito lá dos Cafundós dos Judas queria me processar, porque não pesquisei sobre o trabalho dos biólogos na sua cidade de cinco mil habitantes, na opinião dele, a megalópole da região, para salvar essas preciosidades. Um vereador fez uma moção de protesto, ovacionada pelos outros três, contra o meu texto. O promotor pediu minha prisão preventiva. Um advogado exigia 100 mil reais por danos morais. As senhoras da uma tal "sociedade protetora dos animais silvestres" me enviaram uma carta, na qual deixavam claro o seu repúdio ao meu texto. Partidários da morte das borboletas, porque tinham medo do "bicho", xingaram minha peçonha. Pensavam também em me exigir uma quantia estratosférica por danos morais.

Outro dia me aventurei num texto sobre o fato de os inseticidas pulverizados nas plantações serem "talvez" responsáveis pela morte das abelhas. Uma empresa responsável pela fabricação de inseticidas me pediu esclarecimentos: número do lote, composição química, delimitação da região, senão me processaria por danos morais. Um apicultor me enviou uma mensagem para saber quais eram as espécies das abelhas, número específico de óbitos, dia e hora em que elas morreram. Queria processar qualquer fabricante de inseticidas por genocídio. Uma senhoria me atacou dizendo que eu só defendia as abelhas porque nunca fora picado por uma e pretendia me processar em nome da "Sociedade dos Alérgicos por Picada de Abelhas" por danos à saúde dos pobres alérgicos. O dono de uma abelha de estimação queria um laudo sobre o tipo de inseticida para processar o fabricante da substância mortífera. Lógico, queria uma indenização devido à morte do bicho.

Parei de escrever por um tempo, para me refazer, isto é, procurar um tema que não me fizesse ser alvo do "politicamente correto", nem de processos por danos morais, então resolvi escrever sobre o vento. Disse que, em agosto, venta muito mais do que em outros meses do ano. Um não sei quem ameaçou me processar porque, baseado no código ambiental, me acusava de "sacanear" os outros meses do ano com uma afirmativa tão contundente. Outro, baseando-se numa tal "Associação dos Amedrontados pelo Vento", exigiu que eu me retratasse, senão me processaria por espalhar o pânico entre os cidadãos.

Daqui a pouco, todo mundo se sentirá ofendido por qualquer coisa. Todo mundo se sentirá parte ofendida de uma minoria desprivilegiada e será capaz de processar, agredir e até matar. Vivemos debaixo de uma "fúria legiferante" e da "associação dos ofendidos por qualquer coisa". O mundo ficou muito chato. Está ficando mais chato ainda, porque "há gente" que prega a censura, porque não interpretou direito as Leis que regem a liberdade de expressão no Brasil. Essa gente é formada, faz parte de uma elite "intelectual" e, mesmo assim, usa a lei segundo interesses "interessantes" interesseiros.

Será que, em Marte, há vida inteligente, porque aqui a coisa anda feia. E ainda dizem que vivemos num país em que há liberdade de expressão. Expressão sim, mas careta, não. Alguém pode se sentir vítima. Lá vem processo, indenização ou prisão. 

Se eu não voltar a escrever, por favor, ao me visitarem, não levem cigarro, não fumo. E me ajudem a conseguir uma liberdade para "trabalhar" durante o dia e só dormir na cadeia à noite. Bons sonhos.

Publicado originalmente com o título "Ridículo".


Luiz Cláudio Jubilato é professor de Língua Portuguesa. É fundador e diretor do Curso Criar de Língua Portuguesa, literatura e redação.

Comentários

  1. Aplausos meu caro escritor Sidnei Moura!! Texto espetacular! Fui da estupefação ao riso!!! O mundo está assim mesmo, materialista e hipócrita!! Sem generalizar, claro!!! Adorei!! Parabéns!

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    1. Obrigado Lace! Na verdade, o texto "Censura" é de autoria de Luiz Cláudio Jubilato, mas fico feliz por ter recebido sa visita por aqui. Beijos!

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